segunda-feira, 29 de dezembro de 2008

Pessoas loucas da rua

Estava eu a esperar o ônibus para ir da Escola de Engenharia, num lugar não muito belo, ao Campus da UFMG. Eis que enquanto estou lá, quase perdendo a paciência com os pingos da chuva que cessara há poucas horas ainda escorrendo das marquises dos prédios, chega uma senhora de, sei lá, uns quase 80 anos, dá um leve tapa na mão de uma mulher, aperta essa mão e diz alguma coisa. Faz o mesmo com um homem que suponho ser seu marido e o filho de colo deles.

Mais do que depressa, eu reforço a minha cara de poucos amigos para que ela não faça o mesmo comigo. Não adiantou, lá veio a velha em minha direção. Bateu na minha mão, apertou de leve e me solta um "Dá glória a Deus!". Diante desta frase, a única coisa que consegui foi dar glória a Deus...

Pouco depois disso o ônibus chegou. Subi, pronta para usar meu lindo vale ganhado na AIC (uma ONG, ONGs podem dar vales!). Já na minhas mãos, o transmiti ao trocador, que olhou em minha face, olhou o vale, olhou minha face de novo e soltou:

- Esse vale só valia até novembro.

Decepção. Eu o havia perdido, fiquei tão alegre quando encontrei que não observei as letras garrafais (ok, nem tanto): Validade: novembro 2008. Portando apenas moedas no bolso, pedi para descer com medo de não ter a quantidade suficiente.

Andando por uma das partes mais feias e sujas do centro de Belo Horizonte, angustiava-me a dúvida sobre onde encontraria um caixa eletrônico para chegar ao meu segundo emprego, quando resolvo contar as moedas... R$2,25!

Foi o glória a Deus!

terça-feira, 2 de dezembro de 2008

Desculpem pelo tamanho

Estou chegando à conclusão de que esse negócio de jornalismo não é tão desagradável quanto eu pensava. Hoje quebrei (pelo menos parcialmente) um grande tabu na minha vida devido a tão nobre profissão (cof).

Eu explico.

Eu e as outras bolsistas da Assessoria de Comunicação da Proex (onde faço estágio, para os imaginários desavisados) fomos incumbidas de fazer matérias pra manter o site atualizado durante as férias. Lá fui eu então entrevistar a coordenadora de um projeto que lida com pessoas surdas. Muito solícita ela, por sinal.

No e-mail em que acertamos nosso encontro, ela dizia pra eu procurar no bloco 03 a sala 247 do Instituto de Ciências Biológicas. Lá fomos eu e Rosali, mas ela foi almoçar na cantina. Quando chego ao ICB, qual não é minha surpresa ao notar que os blocos são designados por letras e não números?! Perguntei ao porteiro pela sala 247 do bloco 03, mas acho que ele ignorou a parte do bloco, porque respondeu que "só com a sala fica difícil, porque pode ser no bloco K ou no E... Se 'cê tiver o nome do professor fica mais fácil". Como eu tinha, ele me disse pra ir até outra portaria e perguntar pela professora lá. Quando cheguei, uma senhora me pergunta - suponho que por conta do gravador, bloco e caneta na minha mão. Que caricata, eu! - "Jessica?". Ela 'tava justamente indo deixar recado pra mim no porteiro. Enquanto caminhávamos pro local da entrevista, ela me contou que ia pedir ao porteiro pra me avisar que não estaria mais na sala 247 do bloco O3 [O, minha gente! A letra! Como não supus? Não responda.] e sim no laboratório. Eu, mais uma vez ingênua, achei que só encontraria provetas, béquers (?) e líquidos coloridos no tal laboratório... ledo engano.

Havia cadáveres no laboratório! Cadáveres! Eu, que jamais sequer fui a um velório - não conto o dia em que estava indo no açougue com minha avó e ela entrou no cemitério porque o defunto era noivo de não sei quem não sei d'aonde - na presença de quatro defuntos! Cada um estirado em uma mesa, semi-cobertos por lonas. O último, inclusive tava de bruços. Que aflição! O cara (ou a mulher, não deu pra identificar e, diga-se de passagem, eu nem queria) com a cara espremida contra a superfície!

A professora me pediu pra escolher uma mesa e me acomodar, enquanto ela resolvia algumas coisas. Alguém tem dúvidas de que escolhi a mais distante dos corpos? Que bom. Enquanto esperava ela voltar, fiquei olhando aquela cena e deu pra analisar mais detalhadamente: além dos cadáveres, ao redor da sala havia umas espécies de bacias/baldes, sei lá o que era aquilo, com partes humanas mergulhadas num líqüido que eu não sei qual é e um esqueleto completo que com certeza pertenceu a um, agora ex, ser vivente. Fora que eu acho que um dos defuntos 'tava sem um calcanhar.

Concomitantemente, percebo ao meu redor milhares (ok, talvez uns 15) de pernilongos! Aí a coceira na minha canela fez sentido. Enquanto decidia (o velho problema da decisão...) se os enfrentava com minhas poderosas palmas ou se mudava de mesa, levei mais duas picadas. Resolvi mudar para três mesas ao lado, mantendo a distância dos cadáveres e indo pra perto de um ventilador.

Lá veio a professora de volta, com uma espécie de bandeja na mão. Quando achava que já tinha visto tudo o que podia, ela começa a tirar cérebros de dentro do trem! Espetados com um monte de agulinhas. Suponho eu que pros alunos (entre os quais a namorada do Cícero!) falarem a que região correspondem. Foi nessa hora que eu cheguei à conclusão de que eu, aquela que diz que suporta uma engenharia, mas que jamais passaria sem morrer por uma faculdade de medicina, ou qualquer outra da área das biológicas, talvez conseguisse sim. No final das contas, aquilo tudo tava me lembrando o frango que a minha mãe compra no açougue. Lógico que muito menos vistoso e sem água.

Quando ela veio, me perguntou por que eu tinha mudado de mesa e eu contei dos pernilongos. Ela disse "é mesmo, aqui é cheio! Não sei como ainda não peguei dengue porque eu acho que é aedes!" E este foi, ufa, meu último susto.

Aí fizemos a entrevista. A mulher era realmente muito legal. E fez o projeto parecer também. E eu saí de lá pensando que, não fosse o vestibular, até que eu poderia fazer medicina. Só que, antes mesmo de sair do ICB, eu lembrei que as pessoas que são tratadas estão vivas e aí há uma pequena diferença...

P.S.: Ainda bem que este blog não tem linha editorial nem é jornalístico, porque se fosse, o título 'tava uma bosta!